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sexta-feira, 7 de julho de 2023

"Influencer de Mentira" ("Not Okay", 2022)

 Esta postagem contem alguns spoilers

 

"Fique famosa ou minta tentando". Se a personagem de Zoey Deutch nesse filme fosse música, seria "I Started a Joke" dos Bee Gees.


"Influencer de Mentira acerta na crítica às obsessões midiáticas" 
Giulianna Muneratto - site Tangerina / UOL, 1 de agosto de 2022.



"Você já quis tanto ser notada que nem ligava mais pelo que aconteceria? Deixa eu lhe dizer uma coisa: tenha cuidado com o que você quer." 
Danni Sanders (Zoey Deutch), na introdução do filme



"AVISO DE CONTEÚDO: Este filme contem luzes fortes piscando, temas de trauma e uma protagonista insuportável. Aconselhamos critério ao telespectador". É com esse aviso que "Influencer de Mentira" ("Not Okay", 2022 / em Portugal: "Não Está Tudo Bem") começa antes da vinheta da sua distribuidora, Searchlight Pictures, ao som da famosa fanfarra da 20th Century Fox (de Alfred Newman, 1933), da qual Searchlight é subsidiária. Estrelado por Zoey Deutch, Dylan O'Brien e Nadia Alexander, "Influencer de Mentira" é um ótimo filme do gênero comédia dramática com humor ácido que satiriza influenciadores digitais que anseiam por fama e que também serve de reflexão a quem lhe assiste. Eu admito que amo muito o filme, tanto que merece uma pipoca ou Dorito's como companhia. "Influencer de Mentira" está disponível no Star+.

Danni Sanders (Zoey Deutch / dublada por Hannah Buttel) é uma jovem aspirante à escritora, sem amigos, sem rumo, sem vida amorosa, trabalha como uma editora de fotos para uma revista e é menosprezada pelos colegas. Ela é apaixonada por Colin (Dylan O’Brien / dublado por Felipe Drummond), um influencer pra lá de maltrapilho e maconheiro que tem um péssimo gosto pra se vestir, gosta de relacionamentos momentâneos com garotas ("pegar gatinhas" no jargão popular) e também trabalha na revista. Colin é do tipo que não vale nem o café filtrado da Starbucks, mas tem milhões de seguidores no Instagram no qual posta fotos fumando um baseado e viajando pelo mundo, inclusive no Brasil (até tem uma foto dele diante da Escadaria Selarón, no Rio de Janeiro), o que faz parecer que esse "amor" da Danni por ele é por interesse. Uma buzinada forte nos internautas pra pararem de idolatrar os chamados "influenciadores digitais". Até o próprio Dylan O'Brien que é bonitinho na vida real falou em uma entrevista que queria tirar o sarro dessas pseudocelebridades internéticas ao incorporar o personagem marrento (Tangerina / UOL, 21 de julho de 2022).


O maloqueiro Colin (Dylan O'Brien) no Rio de Janeiro. 

Desesperada por amigos, fama e atenção do Colin, Danni finge uma viagem à Paris para um certo "retiro de escritores" e usa Photoshop para editar suas fotos com imagens de pontos turísticos da Cidade Luz ao fundo para postá-las no Instagram. Com isso ela consegue tudo o que quer, mas um incidente aterrorizante na capital da França acontece e isso se torna parte de sua "viagem", o que faz com que todos se preocupassem com ela, inclusive o influencer maconheiro, e é aí que ela se apresenta como uma sobrevivente de um ataque mortal. 

Olá seguidores, eu estou em Paris. Só que não.


Na volta ao trabalho, Danni que antes era ignorada pelos colegas tem uma chance de escrever um artigo comovente sobre o acontecimento, mas lhe falta criatividade. Para isso, teve que, pode-se dizer, buscar inspiração em um grupo de apoio com verdadeiros sobreviventes de ataques, entre eles, a adolescente Rowan (Mia Isaac / dublada por Laura Hávilla), de quem ela conquista amizade. Rowan sobreviveu um tiroteio em uma escola que matou sua irmã, o que fez com que ela se tornasse uma famosa ativista contra a violência armada para o desgosto dos militares e apoiadores da extrema direita. Danni Sander consegue escrever um artigo, cria a hashtag "Não Estou Bem" ("Not Okay", como no título original do filme) e faz um sucesso retumbante com os feitos, mas tudo isso não passa de um plágio dos conselhos da amiga famosa que fica em choque com o texto familiar publicado na internet, mas isso não abala a amizade entre as duas (ainda), já que Rowan não faz ideia de que Danni queria tirar o proveito dela. Desde que "chegou da viagem" e ganhou prestígio do país inteiro, Danni tem visões de um homem misterioso encapuzado, apontado como o causador do bombardeio em Paris, e de luzes piscando como alertas de que ela estaria fazendo asneiras a cada mentira e atitude oportunista. Como se não bastasse aquela foto bizarra do perfil no Instagram em que ela faz pose com a cabeça inclinada, língua de fora e dois dedos em V como sinal de "paz e amor", Danni posta em sua página uma outra foto pior ainda com a língua dobrada para a parte superior do lábio vestindo a camiseta branca escrita "woke" que, literalmente traduzindo, quer dizer, "acordada". No sentido atual, woke significa, segundo o dicionário Oxford, "estar consciente sobre temas sociais e políticos, especialmente o racismo", como também pode ser usada como um insulto "por pessoas que pensam que outros se incomodam muito facilmente com estes assuntos, ou falam demais sobre eles, sem promover nenhuma mudança" (site Terra, 18 de maio de 2023). Faz sentido.

Rowan (Mia Isaac) e Danni Sanders (Zoey Deutch)

No meio dessa bizarrice toda temos uma salvadora do filme além da Rowan: Harper (Nadia Alexander / dublada por Taís Feijó), que é lésbica, antipaticíssima com Danni e defensora do feminismo que trabalha com os artigos da lendária Juíza da Suprema Corte dos Estados Unidos, Ruth Bader Ginsburg (1933-2020). Eu tenho que admitir que Harper é minha personagem preferida desse filme. Assim que Danni conquista fama e sucesso e ganha a própria sala de trabalho oferecida pela Susan (Negin Farsad / dublada por Andréa Murucci), a editora-chefe da revista, Harper sente inveja dela e, desconfiada da falta de emoção pós-tragédia da "inimiga", começa a persegui-la. É aí que ela descobre as farsas de Danni Sanders e a chantageia para publicar um artigo na internet falando a verdade. Se sentindo pressionada, Danni a obedece e por fim descobre que a obsessão pela notoriedade online tem um preço terrível. Após a revelação, perdeu a amizade da Rowan que entendeu que Danni estava com ela por interesse, o emprego na revista e, pra piorar, foi apedrejada sem dó nem piedade na internet e virou meme e alvo da cultura do cancelamento do mundo inteiro. Até a sua foto tosca do perfil, aquela da língua de fora e sinal de paz e amor, estampou a capa de uma revista famosa no estilo Veja ou IstoÉ com a manchete "Americana Completamente Mentirosa". No fim, Danni Sanders é a personificação daquela música dos Bee Gees, "I Started a Joke" (de Barry Gibb, Robin Gibb e Maurice Gibb) que foi lançada em 1968, mas na era das redes sociais, a letra da música faz mais sentido ainda graças a essa ideia de recorrer à mentira impactante pra ganhar atenção, seguidores, acessos e likes. Parafraseando a letra, Danni começou com uma piada _ de péssimo gosto por sinal_ no momento em que o mundo estava triste e não percebeu que era ela a piada. Assim que ela se viu obrigada a se desmascarar, a história se inverte: o mundo inteiro zomba da Danni, que chora e, envergonhada, exclui suas contas das redes sociais.

Harper (Nadia Alexander): a foto é minha cena preferida.


Curiosidades

*Zoey Deutch também trabalha nesse filme como produtora executiva.

*Quinn Shephard que é roteirista e diretora do filme também participa nele como atriz fazendo o papel de uma das participantes do grupo de apoio dos humilhados na internet para o qual Danni entra em seguida. Sua personagem que também se chama Quinn acusa a confissão de Danni de autopiedade, mas é censurada pela chefe do grupo. Repare que ela só aparece na cena assim que ela fala.


Vamos falar de música?

A ótima trilha sonora original de "Influencer de Mentira" foi produzida pelo canadense Pilou, nome artístico de Pierre-Philippe Côté. Aquelas músicas com coro no filme quase inteiro foram interpretadas pelos grupos vocais Les Voix Mystiques de Saint-Adrien e o quarteto Qw4rtz.

A cena em que Danni Sanders posta fotos da viagem forjada no Instagram é acompanhada pelo punk rock "Ça Plane Pour Moi" (em português, "Por Mim Tudo Bem", De Francis Jean Deprijck e Yves Maurice Lacomblez, 1977), regravada pelo produtor Pilou com a participação da cantora e compositora Anna Jean, vocalista da banda indie pop francesa Juniore, conhecida pela sua influência na década de 1960. "Ça Plane Pour Moi" foi gravada originalmente por Plastic Bertrand, nome artístico do cantor belga Roger Marie François Jouret.
Por falar em JUNIORE, a banda e mais uma vez a sua vocalista Anna Jean marcam presença com a releitura do sucesso da cantora country americana Skeeter Davis (1931-2004), "The End of the World" (de Arthur Kent e Sylvia Dee, 1962) com aquela qualidade sonora com leve eco, digna de produção musical dos anos 1960 e eu adoro de paixão a sonoridade vintage. Sem falar que o sample usado para a releitura foi da gravação original de 1962 da Skeeter Davis, porém com alguns tons reduzidos. Eu escrevi o nome da banda em letras maiúsculas, porque, contrariando outras páginas, não foram Billie Eilish e muito menos Lana Del Rey que a regravaram. A música embala o momento em que toda a mentira de Danni Sanders cai por terra e ela começa a ser malhada por todos, dentro e fora da internet. Ao ouvi-la na primeira vez que vi esse filme me lembrei da versão em português do grupo Roupa Nova intitulada "O Sonho Acabou" (adaptação de Ronaldo Bastos, 1997) solada pelo Paulinho (1952-2020) e incluída na trilha sonora do remake da novela "Anjo Mau" (Rede Globo, 1997-1998). Outra música da banda Juniore incluída no filme é "Ah, Bah D'acoord" ("ah, tudo bem!", de Anna Jean, 2019) na cena quem que Danni tenta convidar sua mãe Judith (Embeth Davidtz / dublada por Izabel Lira) pelo telefone pra sair.
"Bonnie and Clyde" (de Serge Gainsbourg, 1968) cantada pelos franceses Serge Gainsbourg (1928-1991) e Brigitte Bardot foi executada durante o lindo sonho de Danni Sanders em Paris, mas que virou pesadelo ao se deparar com o tal encapuzado responsável pelo ataque no local. A versão original de "Bonnie and Clyde" é colidida com a versão remixada em 2017 por Akse assim que Danni, acordada, volta "desfilando" ao trabalho depois da falsa viagem, chamando a atenção dos colegas que até então a desvalorizavam.
No auge da amizade entre Danni e Rowan, esta revela que sua falecida irmã a acalmava com "músicas velhas" quando estava ansiosa, entre elas, "Complicated" (de Avril Lavigne, Lauren Christy, Scott Spock e Graham Edwards, 2002), primeiro grande sucesso da Avril Lavigne, fazendo com que Danni se surpreendesse com o tratamento de "velha" que Rowan deu à cantora canadense. Na época da produção do filme (em 2022), fez 20 anos que foi lançado o seu primeiro álbum, "Let Go" (Arista Records / Sony Music). Como o tempo passa rápido, não é? No caminho para o comício em que as duas fariam um discurso antiviolência, Danni pede para conectar seu celular ao rádio do carro para tocar "Complicated" para tranquilizar Rowan que ainda tinha medo do palco, e as duas no fim cantam a música empolgadas dentro do automóvel.
"Declaration" (de Cailin Russo, Michael Percy, George Astasio e Dylan Cooper, 2019) da cantora Cailin Russo foi uma ótima escolha para se executar durante os créditos finais, já que a letra condiz perfeitamente com a protagonista. "Esta é a declaração de uma merda / Um produto de como eu fui criada / e eu não espero uma lágrima sequer / ah, eu me sinto envergonhada", diz o refrão. É uma ótima música para se ouvir no fone de ouvido, pois ela destaca cada instrumento musical e os timbres são impactantes.

Vídeo: trailer do filme "Influencer de Mentira" ("Not Okay", Searchlight Pictures, 2022)

 


Fonte: Dublanet (nome de dubladores)

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